Estratégias e desafios na comunicação
Resumo
O uso de telas se tornou uma constante na vida moderna, a ponto de ser raro encontrar alguém sem um celular, tablet ou computador. As crianças atuais são confrontadas com a emblemática “tela” desde o nascimento, ao contrário das gerações anteriores, que exploravam o mundo real e palpável, o qual não eram os objetos (telas) que brilhavam em seus olhos, mas sim seus olhos que “brilhavam” ao contemplar o objeto. Tal artigo discutirá os malefícios desse uso excessivo dos aparelhos e seu impacto negativo no desenvolvimento infantil, em diferentes aspectos.
O Comprometimento do Desenvolvimento Cognitivo
De acordo com Gastaud (2023), o uso excessivo de dispositivos eletrônicos começa a gerar prejuízos cognitivos em crianças quando a exposição ultrapassa o limite de duas horas diárias.[1], o que ocorre com frequência. Zhang (2023) aborda as consequências disso, e o quanto afeta as funções executivas, impactando negativamente a “Memória de Trabalho”.[2] A qual desempenha um papel fundamental no dia a dia, auxiliando na retenção de informações essenciais para a execução de tarefas diárias, como cálculos simples, memorizar algum numero, acompanhar e compreender leituras. Essa capacidade está ligada às funções executivas. Um exemplo claro do funcionamento da Memória de Trabalho e das funções executivas pode ser observado em bebês com cerca de um ano de idade, que já demonstram compreensão da permanência dos objetos. Ao escondermos um brinquedo, a criança é capaz de procurá-lo, evidenciando uma capacidade cognitiva desenvolvida, sustentada pela memória de trabalho e pelas funções executivas. Desta forma, é possível notar a importância de uma cognição saudável. No exemplo dado anteriormente, dificuldades poderiam ser apresentadas pela criança caso houvessem atrasos na Memória de Trabalho e sua função executiva, levando ainda a, posteriormente, se transformarem em dificuldades pedagógicas.
A substituição dos estímulos primordiais pelas telas²:
Para iniciar este tópico, é necessário fazer uma pequena viagem no tempo, retornando às décadas de 1970 e 1980, e relembrar a infância vivida nesse período. Durante esses anos, a tecnologia era escassa, e os smartphones, hoje onipresentes nas mãos das crianças, simplesmente não existiam. As crianças passavam o tempo brincando e explorando sua criatividade. As horas eram gastas em companhia dos colegas, em ambientes fora de casa, como quintais ou até mesmo nas ruas. Esses momentos simples, que poderiam parecer banais, na verdade desempenhavam um papel crucial no desenvolvimento infantil. As crianças eram naturalmente estimuladas, o que contribuía para o desenvolvimento da coordenação motora fina/ grossa, da cognição, da função executiva, da criatividade, da linguagem e da socialização. Por exemplo, uma criança daquela época costumava brincar ao ar livre com os colegas, nesse contexto, a criança sentia o cheiro da grama, ouvia o canto dos pássaros e tocava a terra, o que já representava um importante estímulo sensorial. Conforme mencionado na Revista Nova Escola, as crianças tendem a aprender mais quando seus sentidos são estimulados. Nesse sentido, as atividades sensoriais são essenciais para o desenvolvimento infantil, possibilitando que os pequenos conheçam o mundo por meio de cheiros, texturas e sons.[3]
Além disso, as crianças criavam brincadeiras que exigiam coordenação motora fina, como pegar pequenos objetos do chão, o que favorecia o desenvolvimento do movimento de pinça — habilidade que seria útil mais tarde, por exemplo, ao começar a utilizar o lápis na escola. Brincadeiras como “corre-cutia” e “pega-pega”, estimulava o raciocínio, além de desenvolverem o equilíbrio corporal. Segundo Vygotsky (1984), ao brincar, a criança adquire noções espaciais, aprende e desenvolve seu cérebro para funções como falar e andar.[4] Por meio dessas e de outras brincadeiras, as crianças recebiam estímulos fundamentais para seu desenvolvimento, os quais seriam de extrema importância posteriormente. Isso ocorria fortemente na primeira infância, uma fase crucial para o desenvolvimento humano. Nesse contexto, o sistema de ensino Bernoulli apresentou uma proposta voltada para essa etapa, destacando a importância da primeira infância, que abrange dos 0 aos 6 anos de idade. A proposta enfatiza que essa fase é determinante para um desenvolvimento saudável ao longo da vida, salientando que a qualidade dos estímulos, vivenciadas pelas crianças nesse período exerce um papel fundamental em no desenvolvimento.
As implicações nas dinâmicas de socialização:
Com o uso crescente de dispositivos eletrônicos, o ato de socializar tem se tornado menos frequente e as interações interpessoais têm diminuído significativamente.
Esse fenômeno também tem impactado as crianças, que, em muitos casos, estão perdendo o interesse e capacidade de socializar. Segundo Vygotsky (1991), a interação social é a base do aprendizado e do desenvolvimento intelectual. O autor sublinha repetidamente o papel crucial das interações sociais na vida de uma criança em formação, destacando seus benefícios para o crescimento pessoal.[4] Assim, é importante destacar a relevância da socialização infantil, que muitas vezes ocorre por meio de brincadeiras cotidianas. À medida em que as telas substituem essas brincadeiras, consequentemente as interações sociais também diminuem, o que pode levar a prejuízos no desenvolvimento integral do indivíduo. Neste ano de 2024, a Campanha da Fraternidade também abordou a importância das relações interpessoais, promovendo e fortalecendo os vínculos de amizade. Portanto, é essencial reconhecer a importância das interações sociais, não apenas no contexto do desenvolvimento, mas também para o fortalecimento das relações humanas em geral.
Considerações Finais
O uso excessivo de telas em crianças traz prejuízos em várias esferas, afetando tanto o desempenho escolar quanto as relações interpessoais. Esses impactos não são imediatos, mas se manifestam a longo prazo, muitas vezes repercutindo na vida adulta. Pais e educadores devem estar atentos a essa questão. Segundo Winnicott, o ato de brincar é essencial, pois é nele que a criança encontra total liberdade de criação.[5]
Referências:
[1] GASTAUD, Luiza Morrone et al. Screen time: Implications for early childhood cognitive development. Early Human Development, v. 183, p. 105792, 2023.
[2] ZHANG, Zhiguang et al. Associations between the child care environment andChildren’s in-care physical activity and sedentary time. Health Education Behavior, v. 48, n. 1, p. 42-53, 2021
[3] https://novaescola.org.br/conteudo/21616/brincadeiras-sensoriais-entre- descobertas-e-desenvolvimento
[4] VYGOTSKY, L. (1991). A formação social da mente. São Paulo: Martins Fonte
[5] Winnicot, D. D (1975). O Brincar & a realidade. Rio de Janeiro: Emago Editora
Por Bárbara K Costa Sant`Anna
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